Uma Carta ao Passado
Querido passado,
Escrevo-te hoje, de novo, para te informar que estive a pensar e talvez nunca tenha sido amor. Confesso que posso estar a escrever de forma egoísta, só para te dizer que para mim o ponto final foi definitivamente colocado, mesmo que me assombres em sonhos, mesmo que trema de cada vez que oiço algo que traz memórias... A verdade é que preciso de provas, e esta carta pode ser mais uma.
Vivo num talvez, para não sentir que foi tudo vivido em vão, mas na verdade o talvez pende para um "tenho a certeza". Vivo entre o já foi e o nunca existiu, entre as saudades e a repulsa. Sei que tudo o que senti me fez tomar várias decisões, das quais não me arrependo. Se tivesse sido tudo de outra forma eu não estava tão feliz como estou agora.
E se nunca foi amor? Se fosse amor talvez ainda hoje o meu telefone tocasse, se fosse amor talvez eu fizesse por manter a ligação... Mas talvez ninguém saiba ao certo o que é o amor...
Sabias que sempre que disse não ter tempo, a verdade é que era para alguém em específico que não tinha tempo? Insisti em dizer palavras bonitas, prometi mundos e fundos, e agora o que faço instintivamente é ambicionar não ter dito nada, porque de tanto falar acabei a acreditar em tudo...
Confesso que por momentos desejo que não tivesse entregado tanto do que sou, desejo que me tivesse mantido com uma personalidade intocável e moldada apenas ao que eu queria ser... Hoje sei que tinha tudo, tudo menos o facto de gostarem de mim pelo que era... Tinha tudo menos a minha liberdade de ser.
O que me atormenta ainda mais é saber que estive quase lá, entendes? Houve quase o para sempre, houve quase a ligação, houve quase o compromisso.
Mas ficámo-nos pelo quase e seguimos caminhos diferentes... Corretos ou errados, penso que nunca saberemos, mas parece que foi o momento ideal, um alinhamento de astros que veio mesmo a calhar.
Ainda que pareça que me entrego sempre de olhos fechados a um ciclo vicioso, tudo faz com que sinta que desta vez é diferente. Sei que o coração é outro. Sei-o, porque o sinto. E no fundo é isso que me permite ficar...
O momento seria agora, ou nunca... Sei que se não aproveitasse este impulso, eu nunca te iria escrever, nunca iria despejar tudo o que existe na minha mente.
Só me resta pedir-te desculpa, pelas palavras que não querias ouvir, neste caso ler, e que eu devia ter guardado para mim... No entanto, as tuas frases sufocam-me cada vez que eu me lembro delas... Vê isto como uma retribuição.
Quisémos lutar por um destino que não era o nosso e hoje deixo-te com apenas esta carta e viro-te costas.
Sê feliz,
o teu passado.